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COM O TEMPO - AVEC LE TEMPS / MARIA MORTATTI


Com o tempo

Com o tempo tudo se vai:
os anos de enganos,
as ilusões perdidas,
as perguntas sem respostas.

Quando tudo se foi
e exaustos nos encontramos
na rede estreita do destino,
esquecida toda a ciência,
almas se roçando em carne viva,
na urgência do instante,
enfim, aprendemos a amar.

26.01.2024


Avec le temps

Avec le temps, tout s’efface :
les années de tromperie,
les illusions perdues,
les questions sans réponse.

Quand tout s’est effacé
et, épuisés, nous nous retrouvons
dans le hamac étroit du destin,
toute science oubliée,
les âmes s’effleurant en chaire vivante,
dans l’urgence de l’instant,
enfin, nous apprenons à aimer.

26.01.2024


In: A noite lilás / La nuit lilas. Ed. bilíngue. Posfácio de Michel Thiollent, Scortecci Editora, 2025 


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MULHER / MARIA MORTATTI

 



Mulher

Bela e fera.
Beija e morde.
Bate e assopra.
Teme e deseja.
Luta e perde.
Chora e espera.
Perdoa e revida.
Purga e ri.
Perde e luta.
Sangra e goza.
A das flores.
A das dores.
Mulher qualquer,
mulher.

Maria Mortatti 

In: Mulher qualquer, mulher. Scortecci Editora, 2024.


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ROLAND BARTHES E O PRAZER DO TEXTO: É ISSO! / MARIA MORTATTI

"(...) as leituras da infância deixam nós a imagem dos lugares e dias em que as fizemos", escreve o francês Marcel Proust (10.07.1871-18.11.1922), no opúsculo Sobre a leitura (Sur la lecture), originalmente prefácio para sua tradução, em 1906, de Sesame and lilies (1865), um dos livros mais conhecidos do esteta inglês John Ruskin. 

Não só as da infância. Uma das experiências recentes de leitura me fez lembrar dessa constatação, de quando e por que li os primeiros volumes de À la recherche du temps perdu (Em busca do tempo perdido), de Proust, e dos lugares e dias de tantas outras leituras de que me lembrei quando o li. Uma, em especial, veio-me involuntariamente à memória, a do livro O prazer do texto (Le plaisir du texte), do escritor e crítico literário francês Roland Barthes (12.11.1915- 26.03.1980), com tradução brasileira de J. Guinsburg (Perspectiva, 198?). Li-o um ou dois anos antes do opúsculo de Proust. Foi indicado por um professor que eu admirava. O exemplar era emprestado da biblioteca da faculdade. 

Em um sábado à noite, talvez do ano de 1987, enquanto esperava o horário para um prazeroso passeio com os amigos, sentei-me na poltrona da sala, com lápis e papel ao lado, e comecei a ler como quem apenas se ocupa de uma distração. Aos poucos, porém, fui penetrando no texto. Levantei-me. Fui para cadeira da mesa de jantar. Aprumei-me. Comecei a anotar. Tudo era descoberta. Desisti do passeio, apesar da insistência dos amigos. Retomei a leitura e assim fui até a madrugada. Na memória ficou uma imagem: o prazer do texto, o prazer de desabotoar o primeiro botão da blusa... Não sei se as palavras de Barthes eram exatamente essas, mas assim gravei na memória. 

Anos depois, comprei um exemplar da tradução brasileira. Localizei o trecho. As palavras eram parecidas, mas o sentido se renovou prazerosamente. E assim foi numa outra noite de sábado, quase quatro décadas depois, quando escrevia o prefácio para o livro Cahier de poésie 3 / Caderno de poesia 3, de Michel Thiollent (Scortecci Editora). Reli o livro de Barthes e lá encontrei minhas anotações de antigos momentos de leitura e dos pequenos pormenores que fizeram renascer conexões intertextuais infinitas e angustiantes com outros autores, com “a desenvoltura que faz com que o texto anterior provenha do texto ulterior”, como as macieiras normandas de Gustave Flaubert que Barthes lê a partir de Proust. 

Aquele primeiro botão de sentido cintilou novamente. O prazer do texto é a intermitência. O que seduz é a cintilação da pele entre duas bordas. Assim é a descoberta da relação erótica com os livros que nos escolhem ou escolhemos. Assim foi também com esse livro de Barthes, que despertou em mim o desejo de conhecer sua vasta e sedutora obra. O que faz de um escrito um texto é sua vontade de fruição, seu brio, o ponto onde ultrapassa a tagalerice e arranca do leitor, não um juízo de valor – é bom ou ruim –, mas um juízo de fruição estética: “É isso!”. “O texto de prazer é Babel feliz”.

Maria Mortatti – 28.05.2025


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EDITH WARTHON, PRESENTE DE MR. DURHAM / MARIA MORTATTI

John Mitchell Durham Jr. (02.02.1929-27.11.2008), natural de Dayton/EUA, imigrou em 1957 para a cidade de São Paulo, Brasil, onde faleceu. No início dos anos 1970, foi meu professor de literatura norte-americana no curso de Letras da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara (encampada pela Unesp em 1976). Ministrava aulas em Inglês, e também nesse idioma tínhamos de ler os textos literários e redigir trabalhos e provas da disciplina. Mas, quando se tratava de marcar a data de prova, falava sempre em Português, para não haver dúvidas. Durante uma aula em setembro de 1974, ele ofereceu alguns livros como doação. Fui uma das primeiras a aceitar um exemplar de Ethan Frome – com introdução da autora, romance de Edith Wharton, publicado pela Charles Scribner’s Sons, Nova York, sem data, em edição especial para estudantes. Foi assim que conheci a autora. 

Li e gostei da história e da estrutura da narrativa, que se passa na cidade imaginária de Starkfield, região rural da Nova Inglaterra, EUA, com predominância de clima de inverno rigoroso. Ethan Frome se casa com Zeena. Com pouca coisa em comum, a vida do casal se torna insuportável, Zeena fica constantemente adoentada e chama sua prima Martie para ajudá-la. Ethan e Martie se apaixonam; Zeena, desconfiada, manda a prima de volta para sua casa e pede para Ethan levá-la à estação. Inconformados com a separação, os amantes decidem cometer suicídio juntos, num trenó em alta velocidade em direção a uma árvore. Na descida, Ethan se distrai por um instante com a imagem de Zeena na mente, não consegue atingir diretamente a árvore. Ambos sobrevivem. Ele fica coxo de uma perna e Martie, paralítica. Passam a morar os três juntos, dividindo um quarto pequeno. Zeena passa a cuidar da prima e Ethan arrasta a perna como se estivesse acorrentado numa trágica relação da qual nenhum dos três consegue se livrar.

Edith Wharton (Nova York, 24.01.1862 – Saint-Brice-sous-Forêt, 11.08.1937), autora de mais de 40 livros, além de centenas de contos e poemas, foi uma mulher excepcional para sua época. Não se adaptava aos padrões, costumes e papel destinado às mulheres da alta sociedade nova-iorquina a que pertencia sua família Jones. Ocupava-se desde a infância com estudos, leituras e escrita de histórias e poemas. Na adolescência foi desaconselhada pela mãe a parar de escrever para não afastar possibilidades de casamento, já que escritores e artistas, principalmente mulheres, eram vistos com desconfiança. Mas continuou escrevendo contos e romances em segredo, além de escrever, ela mesma, duras críticas imaginárias sobre seus livros. Com 15 anos de idade escreveu um romance – Fast and Loose (Rápido e solto), publicado postumamente em 1938. Com 20 anos de idade, pouco antes da data do casamento com um empresário do ramo imobiliário, ele rompeu o noivado alegando uma suposta predominância intelectual de Edith e suas reprováveis ambições como escritora. Ela se casou depois com Teddy Wharton, também de família aristocrática. Os interesses de ambos eram diferentes, não tiveram filhos, Edith cumpria suas obrigações sociais e continuou escrevendo e publicando regularmente contos em revistas. 

Destacou-se literariamente aos 43 anos de idade, com o sucesso do romance The house of mirth (A casa da alegria), publicado em capítulos iniciados em 1905, na Scribner’s Magazine. Com a história da protagonista Lily Bart que comete suicídio por não conseguir se encaixar nos padrões da aristocracia, Edith conquistou reconhecimento, fama e dinheiro, tornou-se escritora profissional e não parou mais de escrever, ainda que secretamente na cama, todas as manhãs, como contam seus biógrafos. O casal passou a morar em Paris, onde Edith conheceu círculos de escritores e artistas, teve um amante secreto, causando problemas para seu casamento, e se divorciou para não passar o resto da vida como se estivesse morta. Com base em sua experiência, escreveu o romance que se tornou um clássico: Ethan Frome (1911), com adaptação cinematográfica em 1993, dirigido por John Madden. 

Durante a Primeira Guerra Mundial, Edith escreveu um romance sobre aqueles acontecimentos. Para tentar persuadir os EUA a aderirem, abriu hospitais, tratou de doentes, escreveu relatórios. Por seus esforços em prol dos refugiados da guerra recebeu em 1916 a Legião de Honra do governo Francês, a maior honra concedida a estrangeiros por serviços prestados ao povo francês. Às vésperas do armistício, começou a escrever uma de seus romances mais famosos The age of innocence (1920), cuja história se passa 50 anos antes, no mundo em que tinha nascido, como contraposição às ruínas do período pós-guerra. Com esse romance, foi a primeira mulher a ganhar o Prêmio Pulitzer de Ficção, em 1921. A história foi adaptada para o cinema em 1994, com direção de Martin Scorsese. 

Assim como eu, outros estudantes tiveram a oportunidade de conhecer, por meio de Mr. Durham, Edith Wharton e tantos outros escritores norte-americanos em textos originais. Soube depois, pelo site Faculdade de Ciências e Letras da Unesp – Araraquara, que Mr. Durham formou e manteve por décadas na Faculdade de Ciências e Letras da Unesp – Araraquara, o acervo do Reading Center Prof. John Mitchell Durham, Jr., vários exemplares de mesmos títulos, em textos originais, disponibilizados aos alunos, por empréstimo. Ainda tenho guardado em minha biblioteca aquele exemplar de Ethan Frome com as anotações que fiz na época. Entre elas, estão trechos da introdução feita pela autora, justificando a escolha do tema e da forma: todo tema “contém implicitamente sua própria forma e dimensões. [...] deve ser tratado de forma tão crua e resumida como a vida sempre se apresentou aos meus protagonistas; qualquer tentativa de elaborar e complicar seus sentimentos teria necessariamente falsificado o todo; e o mais interessante da história é sua construção, caracterizada pela simplicidade com que o narrador conta a misteriosa história iniciada no passado da narrativa, sem falsificar sentimentos dos personagens, os “afloramentos de granito”. 

Retomando, quatro décadas depois, o livro e minha história de sua leitura, pude compreender melhor as lições de Mr. Durham. Ao me presentear com o relato do misterioso caso de Ethan-Zeena-Martie, ele me proporcionou também relembrar, mais de 110 anos depois da publicação do livro, a explicação de Edith Wharton sobre os objetivos de um autor: “devem ser sentidos e executados quase que instintivamente pelo artista antes que possa passar para sua criação aquele algo mais imponderável que faz com que a vida circule nela e a preserva um pouco da decadência”.

Maria Mortatti – 25.05.2025 






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UMA CAIXA DE JOIAS LITERÁRIAS CHINESAS / MARIA MORTATTI

BBibliotecas pessoais, mais do que coleção de livros, guardam caixas de joias literárias garimpadas, escolhidas a dedo. Assim penso cada vez que alguma delas – sem motivo aparente – brilha na estante, entre centenas de outras, oferecendo-se à releitura. Assim aconteceu com a lombada verde-jade e o título branco-pérola de A caixa de joias da cortesã – volume II, coletânea de contos das dinastias chinesas Song (960-1279) e Ming (1368-1644), editado e impresso em Pequim, por Edições em Línguas Estrangeiras, em 1987, e distribuído por Corporação Chinesa para o Comércio Internacional de Livros. 

O volume, com seis ilustrações em bico de pena, contém cinco contos – “O chapéu de feltra esfarrapado”; “A caixa de joias da cortesã”; “O vendedor de óleo e a cortesã”; “O velho jardineiro”; “A vingança de um homem justo” –, selecionados entre mais de duzentas histórias populares chinesas do século X ao XVII, inicialmente manuscritos de contadores de histórias, em linguagem popular, que se desenvolveram como gênero literário e foram publicados em coleções no começo do século XVII. Não há indicação do nome do tradutor para o português, mas pode-se presumir que seja ou uma tradução brasileira “anônima” ou mais provavelmente tradução direta de algum entre os que, como Gladys Yang, Yang Xianyi e Sidney Shapiro, traduziram para o inglês muitas obras da literatura chinesa clássica e moderna, integrando as publicações da Edições em Línguas Estrangeiras, fundada em 1952 e com milhares de publicações, em dezenas de idiomas, sobre assuntos diversos e também material didático para estudantes estrangeiros na China. 

No conto que dá título ao volume se encontra uma narrativa entremeada de alguns versos em tom de comentário, na qual é contada a história de amor protagonizada por Décima, a mais linda cortesã da casa da velha senhora e a mais cobiçada pelos homens. Li, filho de alto funcionário imperial e estudante do Colégio Imperial de Pequim, para usufruir da companhia de Décima, gastou todo o dinheiro que o pai lhe dava. Tornaram-se amantes, juraram amor eterno e, apesar das suspensão dos pagamentos e ordens do pai para que ele retornasse, decidiram libertá-la da casa e da condição de cortesã para se casarem. Depois de muitas dificuldades para Li conseguir o dinheiro e as duras condições impostas pela velha senhora para libertá-la, Décima ganhou de uma cortesã uma caixa com a recomendação de somente abri-la em caso de necessidade e o casal partiu em viagem, sem saber ao certo aonde ir sem dinheiro, temendo voltar à casa do pai dele, depois de ter gastado e com uma cortesã o dinheiro que o pai lhe dera e ainda querer se casar com ela. Durante a viagem, Li encontrou o astuto jovem Sun, aceitou seu convite para beber, contou a ele sua história, ouviu seus conselhos e se convenceu a vender Décima para Sun, pois, assim, Li poderia voltar para a casa do pai com dinheiro e sem ofender a família com uma esposa cortesã. Quando Li conta a Décima sua decisão, sentindo-se traída e abandonada pelo homem que lhe jurara amor eterno, aparentemente aceitou ser vendida, enfeitou-se, perfumou-se e abriu a caixa que havia ganhado na partida. Foi abrindo gavetas de dentro da caixa, cada uma com muitas pedras preciosas, flautas de jade e peças de ouro, jogando-as no rio. Chorando de remorso, Li tentava impedi-la, sem sucesso. Depois de contar, em voz alta para as pessoas que se juntaram ao redor do barco, sua história e a traição de Li que a abandonou no meio do caminho, Décima agarrou o cofre, saltou no rio e nunca mais foi encontrada. Li enlouqueceu e Sun, sentindo-se perseguido pelo fantasma de Décima, adoeceu e definhou até morrer. A narrativa termina com estes versos: “Aqueles que nunca amaram devem ficar silenciosos;/ Não é fácil saber quanto vale o amor;/ E ninguém a não ser os que dão valor à constância/ Merece o nome de amante nesta terra”.

O enredo se passa em 1592, no contexto da invasão da Coreia pelo general japonês Hideoshy, no período Wan Li, quando o imperador concordou com o novo sistema de vantagens para os que tinham dinheiro, como facilidades nos estudos dos filhos de funcionários para adquirirem lugar no Colégio Imperial. Passados mais de quatro séculos e em contexto social e geográfico bastante diverso, essa história ainda encanta de diferentes pontos de vista; a mim, pelo realismo lírico com que são representadas as relações de poder e amorosas, especialmente a condição das mulheres. E o reencontro e a releitura dessa caixa de joias chinesas – que garimpei, escolhi a dedo e comprei por US$ 2,50, no dia 16 de maio de 1990, não lembro onde... –  fez-me pensar que a leitura é também um espécie de amor; não é fácil saber quanto valem joias literárias e somente os que lhes dão valor merecem o nome de amantes da literatura...

Maria Mortatti – 16.05.2025

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FERNANDA LOPES DE ALMEIDA, UMA CLARA LUZ NA LITERATURA INFANTIL / MARIA MORTATTI

Clara Luz, a fadinha transgressora, Soprinho, que torna as pessoas desejosas de fazer coisas, e Glorinha, a menina perguntadeira, foram as primeiras personagens que conheci dos clássicos da literatura para crianças criados pela escritora e psicóloga Fernanda Lopes de Almeida ([18.08].1927 – 27.12.2023). Pertencia a uma “família das letras”: era neta da escritora Julia Lopes de Almeida e do poeta e jornalista Filinto de Almeida, ambos entre os idealizadores da Academia Brasileira de Letras, e sobrinha-neta da escritora e educadora Adelina Lopes Vieira e presumivelmente parente da poeta Presciliana Duarte de Almeida, membro- fundadora da Academia Paulista de Letras, onde ocupou cadeira n. 8, cuja Patrona é Barbara Heliodora, sua bisavó. Como conta em entrevista recente para a revista Aletria, cresceu na casa da família no Rio de Janeiro e, mesmo antes de ser alfabetizada, gostava de ouvir histórias e contos de fadas clássicos que a mãe contava e a leitura já se tornara hábito. Por volta dos oito anos de idade começou a escrever histórias e poemas, mas não foi como sua avó, “que a isso se dedicou a vida inteira”. Formou-se em Psicologia, exerceu a profissão por 25 anos trabalhando com crianças e escrevia contos e crônicas para adultos – com influências da obra literária da avó Júlia –, que foram  publicados em jornais e revistas. Mais tarde, quando começou a escrever para crianças, a principal influência foi Monteiro Lobato, mas logo se libertou pois “já estava muito mais consciente do que queria dizer e como dizê-lo”.

Iniciou a carreira literária para crianças em 1970, integrando uma geração de novos escritores que revolucionaram a literatura infantil e juvenil – como Ana Maria Machado, Ruth Rocha, Ziraldo – apresentando novos temas e formas de escrever para o público infantil, com textos e ilustrações sensíveis e poéticos, com objetivo de divertir e propiciar leitura prazerosa, sem preocupação de ensinar. Publicou mais de duas dezenas de livros nas décadas seguintes, com muitas edições e milhares de leitores até os dias atuais e que se tornaram clássicos da literatura infantil.

Entre os que me marcaram, estão: os dois livros de estreia da autora no gênero, A fada que tinha ideias – ilustrações de Edu –, adaptado para peça teatral em 1982, que recebeu Troféu Mambembe pelo Melhor Texto de Teatro Infantil, e Soprinho – ilustrações de Odilon Moraes –, que recebeu o Prêmio Jabuti de Melhor Livro Infantil – 1971, da Câmara Brasileira do Livro e integra o acervo permanente da Biblioteca Internacional para a Juventude; e A curiosidade premiada – ilustrações de Alcy Linhares, que recebeu o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte em 1978.

Clara Luz, Soprinho e Glorinha também fizeram parte de minhas aulas na educação básica e na universidade. Com eles e as professoras de horizontologia e D. Domingas, aprendemos que, quando alguém inventa alguma coisa, o mundo anda; que podemos ver tudo de forma diferente e encantada, quando nos deixamos levar pelo sopro da imaginação; e que, se para certos adultos prêmio só existe quando se pega nele, para as crianças – e adultos também – a curiosidade é premiada com o autoconhecimento e o conhecimento do mundo. 

Não tenho esses livros em mãos. Levei-os para ler com meu neto, deliciamo-nos com a leitura e ficaram na biblioteca dele. Mas são histórias presentes até hoje em minha memória, clássicos que independem do tempo e da faixa etária. Uma clara luz e um duradouro sopro de renovação na literatura para crianças – e adultos também. Basta senti-los. Assim como disse a longeva autora em entrevista para a revista Crescer: “Nunca penso em faixa etária exata, pois as crianças são tão diferentes umas das outras. E acho, como muitos acham, que o bom livro infantil interessa também ao adulto. ... o que faz um livro ser realmente bom? Não se sabe, ou melhor, não se traduz em palavras. Sente-se”.

Maria Mortatti – 13.05.2025


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MASSAUD MOISÉS - "TODO LIVRO TEM SUA HISTÓRIA" / MARIA MORTATTI

Massaud Moisés (09.04.1928-11.04.2018), nascido na capital paulista, foi professor de literatura brasileira em colégios e faculdades paulistanas, até seu ingresso, em 1963, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP – Universidade de São Paulo, como assistente da Cadeira de Literatura Portuguesa, então ocupada pelo professor Antonio Soares Amora, que sucedera Fidelino de Figueiredo, professor português que introduziu os estudos de literatura portuguesa nas universidades brasileiras. Em 1954, Massaud Moisés assumiu essa Cadeira e exerceu outras atividades na USP até se aposentar em 1995. No início dos anos 1960, por designação do Governador Carvalho Pinto em seu projeto de expansão do ensino superior paulista, exerceu a função de diretor da Faculdade de Filosofia de Marília e da Faculdade de Filosofia de Assis, ambas incorporadas à Unesp – Universidade Estadual Paulista, criada em 1976. Foi, ainda, professor visitante em universidades estadunidenses e esteve em visita de estudos na Universidade de Santiago de Compostela, Espanha, dirigiu o Centro de Estudos Portugueses da Universidade de São Paulo, ministrou conferências em universidades brasileiras, norte-americanas e europeias. Recebeu do governo português o título de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e, no ano 2000, assumiu a cadeira de número 17 na Academia Paulista de Letras.

Durante meio século, entre final dos anos 1950 e os anos 2000, escreveu e publicou livros – alguns com dezenas de reedições ou edições revistas e aumentadas – sobre literatura portuguesa e brasileira, crítica e análise literárias, que se tornaram referências para estudiosos, professores e estudantes. Entre eles, estão: Fernando Pessoa: o espelho e a esfingeA literatura portuguesaA literatura portuguesa através dos textosO conto portuguêsPequeno dicionário de literatura portuguesa - Crítico, biográfico e bibliográficoPequeno dicionário de literatura brasileira (com José Paulo Paes); História da literatura brasileira (5 vols.); A criação literária. PoesiaA Criação Literária. Prosa (2 vols.); Dicionário de termos literários. Dirigiu também a Colecção de Textos Básicos de Cultura, da Cultrix. 

Sua obra me foi apresentada no início dos anos 1970 pelos professores Jorge Cury, de Literatura Portuguesa, e Dante Tringali, de Teoria Literária, no curso de Letras da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara, na época instituto isolado de ensino superior, posteriormente também incorporado à Unesp. Com admiração pelo contemporâneo e colega, esses dois professores indicavam e recomendavam a obra de Massaud Moisés como fonte de consulta para nossos estudos universitários e para nossa futura atuação profissional como professores de língua portuguesa e literaturas brasileira e portuguesa no então ensino de 1º. e 2º. graus. Quando perguntávamos sobre a pronúncia correta do nome do autor, Cury respondia em seu característico tom brincalhão: “Alguns dizem ‘Massô’, mas está errado. Ele não é francês, é filho de libanês. A pronúncia correta é ‘Massaúde’. 

Segui as recomendações. Os livros de Massaud Moisés estavam entre os que emprestei da biblioteca da faculdade ou comprei na livraria da cidade, para estudar durante o curso e depois para o concurso de ingresso no magistério público. Na prova de redação, cujo tema era uma comparação entre O Cortiço, de Aluísio Azevedo, e O crime do Padre Amaro, de Eça de Queiroz, fiz uma quase paráfrase da análise que lembrava ter lido em A criação literária (Melhoramentos; Edusp, 7ª. ed.,1975). Outros, como Guia prático de análise literária (Cultrix,1974) e Dicionário de termos literários (Cultrix, 1982), também passaram a fazer parte da minha biblioteca. Nas páginas amareladas estão as marcas do intenso manuseio e anotações para preparação de aulas, análises literárias e pesquisas sobre termos, autores e obras. As lembranças desses livros, recuperei-as para registrar neste texto, quando, dias atrás, ao pegar do chão a capa despregada de A criação literária e devolvê-la ao exemplar na estante, abri-o e encontrei sublinhada a primeira frase do prefácio do autor: “Todo livro tem sua história”. Dei-me conta, então, de que, embora não tenha conhecido Massaud Moisés pessoalmente, meio século se passou desde o início de minha história de leitora de sua obra, quando eu era ainda estudante de Letras em Araraquara, e há mais de 30 anos ingressei como docente e pesquisadora na universidade e na faculdade de que ele foi diretor, contribuindo para a expansão do ensino superior no estado de São Paulo e, de modo duradouro, para a formação de milhares de estudantes, professores e pesquisadores.

Maria Mortatti - 17.04.2025

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POETAS BISSEXTOS – “ESTADO DE GRAÇA DE RARO EM RARO” / MARIA MORTATTI

“Bissexto” (do latim bis sextum) é a denominação do ano civil com um dia extra, 29 de fevereiro, acrescentado de quatro em quatro anos ao calendário gregoriano. Foi a solução matemática criada no século 45 a.C. pelo astrônomo Sosígenes para compensar as 6 horas que sobram a cada ano de 365 dias, 5 horas, 48 minutos e 46 segundos, tempo exato do movimento de translação da Terra em torno do Sol. 

Em 1942, a palavra foi trasladada pelo poeta Vinícius de Moraes (19.10.1913 – 09.07.1980) em artigo sobre poesia brasileira, na revista argentina Sur, de 1942, para se referir em sentido figurado aos poetas “que nós, seus íntimos, chamamos cordialmente de bissextos – poetas sem livros de versos – bissextos pela escassez de sua produção, cuja excelência sem embargo os coloca ao lado dos mais citados”. 

Com base nessa translação semântica, o poeta Manuel Bandeira (09.04.1886-13.10.1968) imortalizou a expressão “poetas bissextos” em sua Antologia de poetas brasileiros bissextos contemporâneos (Zélio Valverde, 1946). Assim explica no prefácio: 


Não procurem a expressão nos dicionários, porque não a encontram. Pelo dicionário, bissexto só há ano, e é o que tem um dia a mais, o que ocorre de quatro em quatro anos. Poeta bissexto deve, pois, chamar-se aquele em cuja vida o poema acontece como o dia 29 de fevereiro no ano civil [...] bissexto é todo o poeta que só entra em estado de graça de raro em raro.”  Mas: “nego que a circunstância de não publicar os poemas em livro ou em revistas e jornais seja característica essencial do bissexto. O essencial é a produção rara.”; “O bissexto, na sua relativa impotência criadora, tem, às vezes, achados que enchem de inveja todo o ‘genus irritabile’. 

O organizador reuniu mais de uma centena de poemas escritos por pessoas que na época exerciam diferentes atividades – escritores, advogados, engenheiros, médicos, sociólogos, professores, jornalistas, padres, pintores. Entre eles estavam: Afonso Arinos de Mello Franco, Aníbal Machado, Dante Milano, Euclides da Cunha, Joaquim Cardozo, José Auto, Gilberto Freyre, João Cabral de Melo Neto, Ismael Nery, Joanita Blank, Leopoldo Brígido, Lucila Godoi, Lucilo Bueno, Luís Aranha, Maria Clara Machado, Maria Helena, Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos, Pedro Dantas, Pedro Nava, Raimundo Magalhães Júnior, Rodrigo M. F. de Andrade, Rubem Braga, Sérgio Buarque de Hollanda.

Nem todos eram “bissextos autênticos”, como o organizador adverte, mas optou por incluí-los para não perder poemas de qualidade. Nem todos eram ou se tornaram contumazes – epíteto sugerido por Paulo Dantas e aceito por Bandeira, como antônimo de bissextos. Vinte e quatro anos depois, na 2ª. edição da Antologia... (Organização Simões, 1964), Bandeira incluiu outros poetas que, nas décadas seguintes, passaram a publicar de modo contumaz, como H. Dobal e Odylo Costa, filho. Provavelmente pelo mesmo motivo, outros, como Joaquim Cardozo e Paulo Mendes Campos, foram excluídos dessa edição. Alguns, ainda, tornaram-se “imortais” quando posteriormente eleitos, pelo conjunto da obra em outros campos e gêneros literários, como membros da Academia Brasileira Letras. 

Manuel Bandeira – poeta contumaz – tornou-se "imortal" em 1940. A Antologia de poetas bissextos contemporâneos, publicada naquele ano, tornou-se um clássico – teve outras reedições, inspirou outras antologias e provavelmente outros poetas contumazes, ou não. E sua solução poética para designar aquele "em cuja vida o poema acontece como o dia 29 de fevereiro no ano civil" foi consolidada em dicionário: “quem exerce pouco determinada atividade (ex.: poeta bissexto)”. 

Maria Mortatti –19.03.2025


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CENA BRASILEIRA NA FOTOPTICA-BRASILIENSE / MARIA MORTATTI

A revista Novidades Fotoptica lançada em 1953 e publicada até 1987, com alterações na periodicidade, formato e conteúdo, foi uma das iniciativas de Thomaz Farkas (17.10.1924-25.03.2011), fotógrafo, cineasta e empresário de origem húngara radicado na cidade de São Paulo. Reconhecido como um dos pioneiros da moderna fotografia e do filme documentário no Brasil, ao lado de grandes cineastas do Foto Cine Clube Bandeirantes, Farkas assumiu, após a morte do pai em 1960, a direção da Fotoptica, primeira empresa especializada em equipamentos fotográficos no País. Com formato de jornal, Novidades Fotoptica publicava anúncios de produtos do ramo, divulgação de livros e concursos, artigos sobre técnica fotográfica e audiovisual, exposições, entre outros. A partir de 1970, com formato de revista, passou a publicar também textos críticos e ensaios  fotográficos.

Não menos importante na cena cultural e literária brasileira foi a Editora Brasiliense, fundada em 1943 na cidade de São Paulo, por reconhecidos intelectuais e escritores brasileiros: Caio Prado Júnior, José Bento Monteiro Lobato, Arthur Neves, Leandro Dupré a Maria José Dupré, cuja casa foi utilizada como primeira sede da editora. A Brasiliense publicou obras fundamentais da literatura e cultura brasileira e internacional, caracterizando-se pelo prestígio de seus autores e como foco de resistência ao Estado Novo e à ditadura militar pós-1964. A partir de 1975, sob a direção de Caio Graco Prado (1931-1992), filho de Caio Prado Júnior, foram lançadas coleções inéditas, como a Primeiros Passos, que tiveram sucesso editorial duradouro, com vendas de milhares de exemplares nos anos 1980. A editora também lançou a Revista Brasiliense, com circulação entre 1955 e 1964, e Leia livros, dirigida por Caio Graco Prado e Cláudio Abramo, com circulação entre 1978 e 1984. A Livraria Brasiliense, na Rua Itapetininga, no centro da cidade de São Paulo, tornou-se referência para encontros de intelectuais, escritores, manifestações, debates e exposições.

No final do ano de 1979, Fotoptica e Editora Brasiliense, reunindo expertises, promoveram o Concurso Cena Brasileira, com ensaios de textos e fotos. Os selecionados foram publicados na revista Novidades Fotoptica, n. 83, de 1978. No editorial consta comentário sobre os ensaios, que revelam a visão de uma parcela significativa da população, na moderna cena fotográfica e literária e cultural e no contexto político da época: “Não importa onde esteja a cena brasileira [...] o que interessa é que muitos jovens brasileiros querem encontrar os vestígios de uma realidade sem os retoques do estúdio”. Como “nos tempos do movimento universitário, a fotografia documento sem ranço de qualquer academicismo sociologismo ou antropologia [...] A unidade de palavra e de imagem muito pouco estimulada na maior parte de nossas situações ganha em vigor e expressão.”

Além da publicação na revista Novidades Fotoptica, os premiados no concurso tiveram a oportunidade de expor suas fotos e poemas em varais estendidos na calçada em frente à Livraria Brasiliense. Lá estava meu poema “Rapsódia brasileira: queimação da cana” acompanhando cinco fotos de Karlos Magnani. Aquela cena da estreia pública da jovem poeta numa paulistana manhã de sábado ficou documentada nas páginas da revista, guardada no acervo pessoal e preservada na memória desta brasileira. 

Maria Mortatti – 16.03.2025

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“LE CARNET DES NUITS”: AUTORRETRATO DE MARIE LAURENCIN COMO POETA / MARIA MORTATTI

Marie Laurencin (Paris, 31.10.1883 – 08.06.1956) ficou mais conhecida como “musa de Apollinaire”, poeta com quem manteve turbulento relacionamento amoroso por seis anos, e “la fauvette”, dada sua proximidade com círculos parisienses de artistas da vanguarda da arte moderna do início do século XX. Mas foi em prosa e verso que a conheci, quando ganhei de presente a edição francesa de 2022 de seu livro Le carnet des nuits (Diário das noites). Ao folhear o exemplar, saltou-me aos olhos o prenúncio da autora em um dos textos, instigando-me a adentrar na história dessa mulher, por meio de biografias e estudos recentes sobre sua obra, e conhecer as aventuras do talento da pintora, gravurista, ilustradora, cenógrafa, que registrou em verso e prosa, não apenas um autorretrato, mas também um testemunho de seu tempo.   

Le carnet des nuits foi publicado na Bélgica, em 1942, durante a ocupação nazista na França. Em 1956, ano da morte de Laurencin, foi publicada em Genebra a segunda edição. Em 2022, foi publicada na França, pela editora La Coopérative, “edição completa com notas e posfácios dos editores”. O livro é ilustrado com três gravuras e 37 textos curtos, 12 em prosa e 25 em verso, em estilo “surrealista” – conforme alguns críticos. É acompanhado de um anexo, com três poemas de Louise Lalanne, pseudônimo de Apollinaire, publicados na revista francesa Les Magres, em 1909. Dois desses poemas são de autoria de Laurencin, que os cedeu ao poeta para que ele os publicasse com seu pseudônimo. O livro é composto de poemas, diários íntimos e lembranças. Além de evocar e testemunhar o período em que ela participou da vanguarda modernista francesa, “traça a evolução interior dessa mulher extraordinária desde a infância, com uma fantasia e lucidez que provocam a imaginação [...] e  completam e enriquecem o conhecimento de sua obra pictórica: pode-se defini-lo como um autorretrato  da artista como poeta”. 

Sem vocação para o magistério, como desejava sua mãe, Laurencin trocou as aulas do Liceu Lamartine por aula em ateliê de pintura em porcelana e depois na Academia Humbert, onde conheceu, entre outros artistas, o pintor Georges Braque, fundador do cubismo, que a apresentou ao pintor Pablo Picasso. Por meio deles, em 1907 conheceu o poeta Guillaume Apollinaire (26.08.1880 – 09.11.1918), que a ela dedicou poemas como “Marie”, “Crépuscule”, “Le pont Mirabeau” e “Zone”, em seu livro Alcools (1913). Embora não tenha se filiado ao fauvismo e ao cubismo, principais movimentos artísticos de vanguarda modernista da época, mantendo estilo estético singular na representação da identidade feminina, com formas suaves e curvilíneas, Laurencin participou de círculos parisienses ao lado de artistas e escritores famosos, como Max Jacobs, André Derain, Henri Matisse. Após se separar de Apollinaire, ela se casou com o pintor alemão Otto von Wätjen, exilaram-se na Espanha durante a Primeira Guerra Mundial, retornaram a Paris, divorciaram-se. Laurencin conheceu outros artistas e escritores, teve relacionamentos amorosos com homens e mulheres, participou de círculos neoclássicos lésbicos, ilustrou 80 livros – entre os quais de André Gide, Lewis Carrol, Somerset Maugham –, produziu cenários e figurinos para o balé russo Les Biches, com música de Francis Poulenc e coreografia de Bronislava Nijinska, e para a Comédie Française, pintou retratos de personalidades parisienses, como Coco Chanel. Durante a Segunda Guerra Mundial, teve o apartamento confiscado pelos nazistas, recolheu-se em apartamento mais modesto, sua saúde se fragilizou. Morreu de parada cardíaca, em 1956, com 72 anos de idade, deixando uma biblioteca de 5000 itens. Em seu testamento, pediu que fossem colocadas em sua mão uma rosa branca e uma carta de amor de Apollinaire. 

Apesar do reconhecimento da crítica e do público nas décadas de 1920 e 1930, sua obra ficou relativamente esquecida na França e na história canônica da arte. Mais recentemente, vem despertando novo interesse de críticos, estudiosos e historiadores da arte, conquistando novos admiradores e crescente notoriedade póstuma. Em 1974, o poeta anarquista francês Léo Ferré musicou o poema “Marie”, de Apollinaire. Em 1975, o cantor francês Joe Dassin a mencionou na canção L'été indien. Em 1979, coleção de suas obras foi comprada em leilão pelo empresário japonês Masahiro Takano e expostas no Museu Marie Laurencin de Tokio – que encerrou atividades em 2019. No Brasil, seu quadro Guitarrista e duas figuras femininas (1934) integrou o primeiro lote de quadros quando da inauguração, em 1947, do Museu de Arte de São Paulo. Suas obras constaram também de exposições coletivas de artistas estrangeiros em galerias brasileiras, nos anos 1973, 1995 e 2002. 

Nas últimas décadas, a artista vem sendo “redescoberta” também em estudos acadêmicos e catálogos de exposições, que possibilitam ampliar a compreensão de seu lugar na história das artes plásticas e da literatura de autoria feminina. Em 2011, foi lançada sua biografia em inglês, escrita por Bertrand Meyer-Stabley; em 2013, sua obra foi exposta no Musée Marmottan Monet, em Paris, entre outros exemplos. Também vem sendo conhecida e divulgada sua produção como escritora em prosa e verso: correspondência inédita, prefácio, textos em revistas e Le carnet des nuits, pelo qual a conheci. Quase 70 anos após a morte, sua obra continua ecoando, provocando reflexões e contribuindo para a compreensão do lugar, muitas vezes esquecido, das mulheres na história da arte e da literatura e para lembrar que “... ter talento é uma aventura que vale a pena...”. (Marie Laurencin)

Maria Mortatti – 08.03.2025

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Obs.: As informações sobre vida e obra de Marie Laurencin sintetizadas neste texto foram extraídas do posfácio da edição francesa de 2022 de Le carnet des nuits, da Wikipedia, de artigos e de catálogos de galerias e exposições disponíveis on-line, principalmente Casa Museu Eva Klabin e Pallant House Gallery.  Os trechos do livro citados em português foram traduzidos por mim.  

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