O meu foi em 1986. Dezessete anos depois do primeiro amor. Este – o amor – não era só meu, por ironia. O livro também não, mas por opção. Dividi-o com três homens com quem compartilhei viagem a Cuba: Rubens Pantano Filho, José Herculano da Silva, Pedro Ivo Ribeiro de Assis Bastos. Eram meus colegas na Universidade São Francisco, campus de Itatiba/SP, onde eu lecionava, além do magistério na educação básica em Campinas. Com outros colegas professores de Campinas, participamos do Congreso Pedagogía/86 – Encontro de Educadores para um Mundo Melhor, realizado em Havana-Cuba, de 27 a 31.01.1986. Os relatos de nossas atividades e os resultados da participação no Congresso estão sintetizados no livro de que nós quatro somos coautores: Quem sabe ensina: quem não sabe aprende: a educação em Cuba (Papirus, 1986).
Meu registro pessoal está nas muitas páginas de um diário de viagem: a partida de Campinas, as peripécias da “escala” compulsória (na ida e na volta) em Lima/Peru, para carimbar o passaporte (até aquele ano, não era permitida viagem a Cuba, país com que o Brasil não matinha relações diplomáticas...), a chegada a Havana, a hospedagem no majestoso Hotel Nacional, a participação nas atividades oficiais do congresso, as aventuras clandestinas, a visita a “Habana Vieja”, ao bar de García Márquez, à família de cubanos que nos receberam e os muitos episódios pitorescos, inconfessáveis nos registros oficiais da viagem... Dois deles compartilho aqui.
Em meu primeiro passeio pelo pátio ajardinado do hotel, aproximou-se um jovem cubano que me perguntou com naturalidade: “¿Eres comunista?”. Pega assim de surpresa, respondi com uma matreira piscada d'olhos: “¡No puedo! Soy brasileña...".
No dia de finalmente conhecermos Fidel Castro, na recepção oficial aos congressistas, no Salão de Protocolo de Cubanacán, nesse dia tão esperado por todos nós, acabei perdendo o encontro com “mi papá”... Ele demorou tanto a aparecer, tanto suspense em torno de sua chegada, tanto rum que tomei para me preparar para o grande momento, que... desmaiei, fui medicada e levada de volta ao hotel de maca numa ambulância...
Bem, não pude ver Fidel nem apertar sua mão, como eu tinha planejado. Mas trouxe quatro garrafas de rum ouro, que saboreei por pouco tempo, uma caixa de charutos, muitos livros e discos, que ainda guardo. E ficou principalmente e para sempre a emoção de escrever minha parte do primeiro livro – na máquina verdinha Olivetti, no escritório do apê campineiro – e o inesquecível prazer de tocá-lo no papel impresso, de cheirá-lo, abraçá-lo e repousá-lo ao meu lado esquerdo na cama, como um amante, só meu, para sempre...
De meu primeiro livro nunca me esqueço!
Maria Mortatti – 23.08.2020
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Nas imagens abaixo: capa, orelha e contracapa do livro, foto com o Ministro da Educação de Cuba, convite para a recepção com Fidel Castro e a caixa de charutos.